sexta-feira, 24 de abril de 2009

"Para nascer de novo, é preciso morrer primeiro."

"O meu nome é Gibreel. Podem rir, eu sei que é engraçado. Tem gente que me chama de Gengibre, nossa, eu já ouvi tantos nomes... Gibrael, até de girafa já me chamaram... Foi minha mãe que escolheu esse nome. Bom, ela era na época usuária de drogas, eu acho que isso explica muita coisa... No Islamismo dizem que as palavras do alcorão foram recitadas a Maomé pelo Arcanjo Gibreel, talvez por isso o nome, contudo, minha mãe nunca foi Islâmica, não, que eu saiba, sinceramente, acho que ela nunca foi nem em uma igreja, que dirá uma mesquita ou algo do tipo... Enfim, estou aqui e vos falo, meu nome é Gibreel, mas não sou nenhum Arcanjo. E houve uma época em que se eu tivesse asas teria vendido para comprar heroína."

"Sou usuário de drogas. E já uso há muito tempo. Às vezes creio que desde que nasci... não me lembro de uma época sem as drogas. Mas me lembro de como Lynn era feliz antes... Estranho, não? Lynn é a mulher que amo, minha alma, minha poesia, meu sol, minha lua. Eu a perdi..."

"Eu a perdi!"

"Não vamos falar do que está perdido, mas continuar, olhar pra frente. Afinal é pra isso que todos nós estamos aqui, não? Prosseguir, seguir adiante. E para isso que estou aqui dando o meu testemunho. Falando a vocês sobre a epopéia de minha queda. O meu preâmbulo. Desculpem a eloqüência. A abstinência me deixa assim. Eu posso falar por horas e, acabo de perceber que comecei da forma errada..."

"O meu nome é Gibreel Hewitt Mulheim. Sou escritor de livros não lidos, e hoje faz 342 dois dias, uma hora e cinqüenta minutos desde a ultima vez que injetei heroína no meu corpo."

Foi sim um belo testemunho. Muitos aplausos, abraços, vivas, solidariedade, compaixão...

Três dias depois disso o meu telefone tocou era o Randall.

"Olá, Gibreel" – ele começou.

"Olá." – respondi-lhe não muito animado.

"Estou ligando porque desde a ultima vez que nos falamos, eu fiquei te esperando vir buscar o seu último salário e até agora nem sinal de você. Ficou maluco de vez é? Agora até dinheiro esta dispensando?" – disse Randall.

"Eu passo ai amanhã."– falei ainda sonolento. Tinha tido uma noite difícil, mesmo estando há meses sem heroína, todas as noites tem sido uma tortura devido a abstinência.

"Espero que faça mesmo isso, Gibreel, não só pelo seu dinheiro, garoto, mas porque eu sempre gostei muito de você. Eu teria pedido a Lynn para levar, mas sabe como é, não? Ela marcou a data do casamento e acho que o noivo dela não gostaria muito..." – não deixei que ele terminasse e desliguei o telefone.

Ela marcou a data do casamento... É claro, um casal que ficou noivo tem toda a intenção de casar, certo! Mas, marcaram a data do casamento... É como se isso tornar-se a coisa real, mesmo ela tendo sempre sido... Uma funesta dose de realidade, uma overdose de verdades...

Quando você usa heroína pela primeira vez é como se tocasse Deus. É ser aceito no paraíso, entre anjos e serafins. É sentir uma comunhão com tudo o que é sagrado e divino. É atingir o ápice da compreensão, mesmo que tudo ainda lhe seja muito confuso... É tirar todo o peso dos seus ombros. É dar um grande foda-se a tudo o que te perturba. Foda-se o mundo, você sequer faz parte dele. Você é um alienígena e sua casa é bem longe atrás do sol. Esta além de questões de humanas...

Marcaram a data do casamento. E por que não ficar, além disso? Porque não dar um grande foda-se a isto?

E foi o que eu fiz em 17 de outubro de 2008, ás 20 horas de uma noite sem estrelas. Dei um grande foda-se a mim mesmo... Como eu fiz isso? Não esta obvio ainda?

E o ritual reiniciou depois de tanto tempo. É simples quando se tem o hábito; uma colher, a heroína em pó, um limão e um pedaço de algodão. Estes são os ingredientes básicos. Vamos adiante.

Modo de preparo.

Colocamos a heroína em pó na colher, um pouco de água, umas gotas de sumo de limão, uma fonte de calor, eu uso o isqueiro, o algodão para filtrar as impurezas. Introduzindo a droga na seringa, esta preparada à injeção...

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